som. 1 Tudo o que soa ou impressiona o sentido do ouvido. 2 Ruído ritmado, produzido por vibrações sonoras que se sucedem regularmente. 3 Timbre. 5 Palavra cuja articulação é mais ou menos agradável ao ouvido.
quarta-feira, março 26, 2008
A MÚSICA DA TERRA
A dor habita em nós, o cravo a ignora.
A vida, uma gavota? Pura dança
o amor? No minueto de Lully
cabe a dificuldade de existir?
Quinta-essência do angélico, no caos
paira a graça de Mozart sobre o abismo,
sem devassá-lo - pássaro de nuvem.
O tempo é outro metal, a comburir-nos.
Urge romper o gosto, a norma límpida,
e sangrentas estilhas do momento
passar à forma nobre da sonata.
Urge extrair do piano o som dramático.
E sucitar o diálogo patético
entre piano e violino, qual se escuta,
na penumbra da alma, a duas vozes,
um rumor de paixão se entretecendo.
Eis que a música deixa de ser pura.
Os serafins e os elfos se despedem.
A terra é lar dos homens, não dos mitos.
Há que desmascarar nosso destino.
Em tatear incessante, no conflito
corpo a corpo entre o ser e a contingência,
nova música, ungida de tristeza
mas radiante de força, vem ao mundo.
Luta o homem na área desolada
de sua solidão; luta no palco
fremente de contrastes, percebendo
que pouco a pouco cerram-se os espaços
da percepção, e tudo se limita
à captação interna, de sinais
salientes, impalpáveis, invisíveis,
nunca porém tão vivos se captados.
À proporção que a dor aumenta, e em volta
nega-lhe o amor seus bálsamos terrestres,
ganha requinte a fábrica sonora
de eternizar a vida em breve arte.
Es muss sein! É preciso! Na amargura,
na derrota do corpo, sublimada,
a canção do heroísmo e da alegria
resgatam nossa mísera passagem.
E entreabre a sinfonia suas palmas
imensas, a conter todo o rebanho
de perplexos irmãos, de angustiados
prospectores de rumo e de sentido
para a sorte geral. O homem revela-se
na torrente melódica, suplanta
seu escuro nascer, sua insegura
visão do além, turva de morte e medo.
Ó Beethoven, tu nos mostraste o alvorecer.
*
(Calros Drummond de Andrade)
Amém!!!
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